Carmo Dalla Vecchia, aos 53 anos, está prestes a lançar sua mais recente obra artística, o espetáculo “Todo Chapéu Me Lembra Você”. Esse projeto tem como foco central explorar as diversas nuances do amor e as lutas intrínsecas à identidade LGBTQIA+. Por meio de uma abordagem sensível e crítica, o ator busca criar uma ponte entre o amor universal e os desafios específicos enfrentados por pessoas que se identificam com a comunidade LGBTQIA+.
A peça estreou em São Paulo na sexta-feira, 17 de setembro, e já começou a chamar a atenção do público e da crítica. No podcast recente do Gay Blog Br, Carmo foi convidado para discutir tanto o conteúdo da obra quanto o papel da representatividade LGBTQIA+ nas artes e na mídia. Durante a conversa, ele não apenas abordou a narrativa da peça, mas também destacou as dificuldades enfrentadas por personagens queer em encontrar representações autênticas e não estereotipadas.
Carmo, que é amplamente conhecido por sua carreira multifacetada, que inclui atuação, modelagem e fotografia, fez questão de frisar a importância de desafiar os estereótipos que ainda dominam a mídia. Em entrevista ao gestor cultural Maurício Kino e ao editor-chefe Vinícius Yamada, o ator criticou de maneira superficial com que personagens LGBTQIA+ são retratados em produções televisivas e cinematográficas.
“Geralmente, o gay só aparece para ser engraçado, divertido e fazer os outros rirem. Se você é engraçado, se você faz piadas, eu permito que você exista. Mas, mesmo assim, o beijo na boca não acontece, né? Beijar na boca é algo proibido. Isso ainda é visto como um tabu. Eu vejo tantos gays por aí iguais a mim, vivendo vidas reais, mas sem essa permissão na ficção”, comentou Carmo, de forma crítica, sobre o lugar limitado dado às representações LGBTQIA+ na mídia.
Ele ainda continua, refletindo sobre o tipo de histórias que são contadas: “Eu nunca vi uma história de dois homens sendo contada sem que, necessariamente, a questão sexual tenha que ser o foco. Não pode ser uma história de dois homens vivendo suas vidas, com questões diversas, sem que o fato de serem gays seja a única coisa que importa? E, quando existe um beijo, é aquele ‘beijinho no escuro’, escondido, quase que para não ofender a dona de casa que está olhando. É como se nós não pudéssemos existir de maneira plena nas histórias”.
O ator também questionou a ideia de que o público, especialmente as donas de casa, ainda não está preparado para ver certas representações LGBTQIA+ nas telas. “Não me venha com esse papo de que as pessoas não estão preparadas para ver isso. Se eles não estão, é nosso papel ajudá-los a serem qualificados, e não simplesmente cortar cenas importantes. Acho que é muito triste que, em pleno 2024, ainda tenhamos que discutir algo tão básico como o direito de existir plenamente em uma narrativa. Acho que em breve, as pessoas vão perceber o quanto foram mesquinhas ao não colaborarem para que o preconceito diminuísse”, afirmou com sinceridade.
Carmo Dalla Vecchia é um defensor ferrenho da representatividade e acredita que as produções artísticas têm um papel crucial na mudança de mentalidades. Para ele, a arte pode e deve ser um espaço de inclusão e questionamento das normas sociais. O ator, que ao longo de sua carreira sempre buscou papéis desafiadores e diversificados, vê nesse novo espetáculo uma oportunidade de contribuir para um debate mais profundo sobre o lugar dos LGBTQIA+ nas narrativas culturais.
Além de sua carreira artística, Carmo também vive uma vida pessoal que reflete muitos dos valores que ele defende em suas obras. O ator vive um relacionamento de 18 anos com o renomado autor de novelas João Emanuel Carneiro. Juntos, eles são pais de Pedro Rafael Carneiro Dalla Vecchia, de 4 anos, que nasceu por meio de uma barriga de aluguel. A paternidade, segundo Carmo, é uma conquista pessoal e também uma forma de desafiar os estereótipos de família que ainda persistem na sociedade.
Durante a entrevista, ele comentou sobre sua experiência como pai e a importância de sua presença no debate sobre o desenvolvimento infantil. “Eu acho extremamente importante, principalmente para nossa comunidade, que um homem gay, como eu, fale e dê opinião sobre o desenvolvimento infantil saudável. Isso é uma conquista para todos nós. É uma forma de mostrar que podemos ocupar todos os espaços, inclusive o da paternidade”, disse ele com orgulho.
Carmo também abordou, de forma bem humorada, os papéis que ele e João desempenham em eventos sociais. “Eu sempre brinco que sou a mulher da relação. Quando vamos aos jantares, geralmente fico conversando com as mulheres, enquanto ele se junta aos homens para falar de economia e política. Eu, por outro lado, falo sobre educação infantil e, às vezes, as mulheres ficam surpresas com o quanto sei sobre o assunto. Elas perguntam: ‘Como é que você sabe disso e eu não?’”.
Em tom de brincadeira, Carmo apresentou uma curiosidade sobre sua experiência durante a gestação de seu filho. “Eu tive melasma na gravidez, gente! Quando meu filho nasceu, eu tinha uma mancha de melasma bem no meio da testa. Normalmente, isso só acontece com mulheres grávidas. Ou seja, eu fui tão viado, mas tão viado, que desenvolvi um hormônio que só as mulheres grávidas geralmente têm”, contou ele, arrancando risadas dos entrevistadores.
Para Carmo, a experiência da paternidade e o reconhecimento de sua identidade LGBTQIA+ são conquistas que andam lado a lado. Ele acredita que viver de forma autêntica, tanto no campo profissional quanto no pessoal, é uma maneira de abrir portas para que outras pessoas também possam fazer o mesmo. Sua visão sobre a importância de desafiar os estereótipos, tanto na mídia quanto na vida real, reflete seu compromisso com a luta por uma sociedade mais inclusiva e justa para todos.